
Na Guiné-Bissau a gravar um videoclip com o DJ Mandas, Manecas Costa quer dar a conhecer a terra natal aos dois filhos mais novos. Um desejo ao qual junta outro: actuar com eles, já que são cantores como o pai.
Está a gravar um videoclip na Guiné-Bissau. De que música se trata?
É uma música nova, que eu e o DJ Mandas construímos em conjunto. Chegámos à conclusão de que, como somos da Guiné-Bissau, a melhor forma de promovermos a música seria gravá-la aqui. E tem sido muito bom. Estamos também a promover as cores da Guiné-Bissau, os tambores, a dança e o povo.

Como se chama a música?
“Mantenha”, que é saudação. Mostra a nossa preocupação com a Guiné-Bissau, com os seus instrumentos, sobretudo a tina, que representa muito para o País. Como a guitarra portuguesa está para Portugal, por exemplo. Tem essa força, essa qualidade rítmica, é um instrumento básico da nossa cultura.
Que outras manifestações culturais abraça o vídeo?
Temos também os netos de Bandim, um grupo de teatro e de dança. São jovens que querem fazer a parte da história. Queremos juntar várias gerações, que podem naturalmente transmitir essa preocupação, essa qualidade, que a Guiné-Bissau bem precisa.

Que influências há na canção?
Tem influência do DJ Mandas, que traz novos sons, como afrobeat e R&B, e a minha influência, que é a originalidade da música da Guiné-Bissau, neste caso tina, tambor de água, palmas, a qualidade vocal que prevalece na música, a própria melodia. Faço as guitarras, a voz, a performance, a qualidade de tocar africano, aquilo que costumo chamar do “ritmo pega pé”. É um ritmo que criei para mexer ou então trazer outro tipo de alma à música da Guiné-Bissau.
Como conheceu o DJ Mandas?
O DJ Mandas é um nome muito conhecido na Ásia, viveu muitos anos na China e tem estado por aí. Tem uma qualidade fora do normal. E é um jovem que sempre me quis conhecer. Andou atrás de mim e não tinha o meu contacto, falou com outra cantora, a Carina Gomes, e ela falou comigo para passar o meu contacto. Ele ligou-me, começamos a falar através do WhatsApp. E entendemos que podíamos colaborar.

Quando é que gravaram a música?
O ano passado, em Maio. E hoje estamos aqui na Guiné-Bissau a concluir a nossa ideia, de estarmos juntos no nosso país a promover a música e a nossa terra. Além da cidade que escolhemos e mais surpresas que vão estar no vídeo.
Onde foram as filmagens?
Em Saltinho, que é um paraíso da Guiné-Bissau, em Cussilinta, que fica a três horas da Cidade de Bissau, onde também gravámos, no Bairro Mindara. Correram muito bem as gravações com a equipa da Prisma Videos, assim como com a produtora Kavi Music.
MÚSICA É A RESPOSTA PARA UNIR GERAÇÕES

Costuma ir muitas vezes à Guiné-Bissau?
Não vinha há três meses, mas sempre que posso venho para matar saudades, trabalhar e conviver com músicos locais. Tentar perceber o que está a acontecer. Qual é o novo som, qual é a nova música que está com sucesso. O que está a acontecer na cidade.
Ainda tem familiares aí?
Tenho primos, uma irmã mais velha. Sempre que posso venho visitá-los, abraçá-los, passar algum momento com eles é gratificante. Matar saudades da terra e estar com a família é sempre bom.
Vai visitar Cacheu, a sua terra natal?
Desta vez não vou conseguir. Estamos mesmo focados nas gravações. Sou muito profissional, não quero confundir as coisas. Cacheu nunca foge, em qualquer momento posso voltar a visitar a minha terra.
Tem três filhos. Eles conhecem a Guiné-Bissau?
O mais velho nasceu na Guiné-Bissau, tem 32 anos, chama-se Wilson. A do meio é a Alexandra, conhecida por Paloma, tem 24, e o Ricardo tem 18. Os dois mais novos não conhecem a Guiné-Bissau, tenho uma grande vontade de trazê-los à minha terra natal. Seria bom que conhecessem um pouco dos sítios onde eu brinquei, a casa dos meus pais, tudo o que foi a minha inspiração, a minha juventude. Espero que isso aconteça um dia.
Algum deles segue a carreira na música?
A minha filha e o meu filho mais novo cantam e adoram música. A minha filha canta R&B, pop, música soul, jazz, são as influências dela, que gosta e tem como referência. O mais novo faz rap. O ano passado lançou um som, que entrou no top 50 de melhores músicas de rap em Portugal. Eles vivem comigo, mas fazem promoções da música deles. Eu nem gosto de interferir.

Fica feliz por estarem na música?
Sinto que é a continuação. São talentos que tenho em casa, querem muitas vezes mostrar aquilo que eles valem. A minha filha, por exemplo, já toca guitarra, violão, clássica. E o mais novo sempre gostou de percussão. Gostava um dia de partilhar o palco com eles. Vamos ver se isso acontece. Deus é pai.
Continua a fazer música para mostrar uma Guiné-Bissau bonita e positiva?
Defendo sempre uma imagem positiva da Guiné-Bissau. A identidade da minha música é muito parecida com o povo da Guiné-Bissau, vejo isso assim. Portanto, tudo o que faço na minha música tem uma representação enorme dos nossos instrumentos. Quero até ao fim da minha vida dar o melhor da música da Guiné-Bissau, passar sempre um bom registo, justificar porque faço parte do mercado internacional da música. Sou sempre solicitado, graças a Deus, e tento ao mais alto nível representar a minha cultura.
Como encara ter jovens como o DJ Mandas a quererem trabalhar consigo?
A juventude não me larga. Cada vez que estou com eles sinto-me jovem, admirado, acarinhado. Não falo só dos jovens da Guiné Bissau. Já trabalhei com os Calema, de São Tomé e Príncipe, com a Soraia Ramos, de Cabo Verde. Chamaram-me há pouco tempo para colaborarmos. Está aí o sucesso deles à vista e sinto-me parte disso. Vivo o sucesso deles como se fosse o meu.

Portanto, vê isso como uma colaboração natural?
É por aí que as coisas devem acontecer, com essa naturalidade, estou aberto em poder ajudar aqueles que me chamam com respeito, admiração, carinho e entendem que sou útil à música deles. Sinto não só responsabilidade, mas que é bom tentarmos sempre fazer a passagem de testemunho ao mais alto nível. Daqui a 20 ou 30 anos não vou ter a mesma força. É preciso acompanhar, transmitir valores, passar legados e ter orgulho da nossa experiência com novos protagonistas. É bom que haja mais Manecas Costas, mais pessoas com esta determinação musical. Sou muito exigente no que faço.
Que conselhos deixa aos mais jovens?
Valorizar a cultura, porque o que é nacional é bom. Cada etnia tem a sua forma de estar, a sua própria língua viva. O crioulo acaba por ser o elo de todas as etnias. Somos um povo com essa sorte de ter esta mistura. É explorar os sons de cada etnia, explorar coisas que a Guiné-Bissau tem. Não estou a dizer que os jovens não podem inovar e ter as influências deles, mas gostava muito que tudo o que é a base da nossa música não se perdesse na música que os jovens estão a iniciar. É imperativo que os jovens apostem em estudos e nas pesquisa das suas origens, tradições e valores. Fazer a música deve ser encarado como uma forma de construção de carreiras, mas também de compromisso com a transformação do estado do nosso País, de África e do Mundo.
